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http://oglobo.globo.com/pais/posse-de-joaquim-barbosa-simbolica-para-negros-6793504
Movimentos sociais se dividem quanto a novo presidente do STF assumir
papel de denúncia do racismo
Martinho da VilaDIVULGAÇÃO
RIO e SÃO PAULO — A posse de Joaquim Barbosa na presidência do Supremo
Tribunal Federal (STF) é marcada pelo simbolismo da chegada de um negro a um
alto cargo na estrutura de poder, mas movimentos sociais ligados à questão
racial no Brasil se dividem sobre o papel que o ministro deve assumir. Um grupo
defende que é o momento de enfatizar a discussão sobre o racismo e a
desigualdade na sociedade brasileira. Para outros, não cabe ao ministro
levantar bandeiras.
O novo presidente do Supremo em sua vida acadêmica sempre explorou a
desigualdade social e o racismo como tema de teses e palestras. Mas no
exercício profissional, seja no Ministério Público Federal ou no próprio STF,
nunca se levantou como porta-voz da discussão.
— Esperamos que Barbosa tenha uma visão especial sobre a desigualdade e
o racismo no Brasil. Ele pode ter o papel de trazer à tona a discussão sobre o
racismo para dentro da Justiça brasileira. É uma oportunidade de um negro
assumir esse discurso na mais alta Corte do país. Senão, sua passagem pela
presidência do Supremo se tornará apenas figurativa — defende Rubens Souza,
consultor do Instituto Raízes.
— Barbosa, no rito da presidência, não pode suscitar uma discussão ou
levantar a bandeira (do racismo). Ali, ele é o chefe de um dos Poderes do
Estado e sua gestão tem que ser marcada como uma gestão para todos. Não só para
os negros — contrapõe Jerônimo Silva Junior, secretário-geral da União de
Negros pela Igualdade (Unegro).
O presidente da Educafro, Frei Davi Santos, afirma que, mais que ser um
representante negro no Supremo, Joaquim Barbosa reafirma as questões raciais e
combate o racismo no país:
—Você vê Joaquim Barbosa falando com determinação, com muita ousadia,
que o poder do Brasil é branco, é conservador e oprime o negro.
O jurista Ives Gandra acha que a origem humilde do novo presidente do
STF deve ser levada mais em conta.
— O mérito de Barbosa não é ter chegado lá apesar de ser negro. É por
ele falar cinco línguas, ser uma pessoa profundamente culta, etc., apesar de
sua origem social — diz Gandra.
Já Carlos Melo, cientista político do Insper, e o jurista Celso
Campilongo, da USP e da PUC-SP, acreditam que o fato de Barbosa ser negro é
razão primordial para sua ascensão até a alta Corte.
Melo acha que o simbolismo pode auxiliar o debate sobre a questão do
acesso dos negros à educação de qualidade e, mais ainda, sobre a necessidade de
se “resgatar a importância dos negros na formação cultural e econômica do
Brasil”.
— Nomes importantes da nossa cultura eram negros ou mestiços: Machado de
Assis, Aleijadinho. Por que só falamos de negros importantes na música e no
futebol? Acho que o país precisa acertar as contas com suas realidades negra e
mestiça — avalia Melo.
Para Campilongo, a nova função de Barbosa e o julgamento do mensalão
contribuem para combater a sensação de que o Direito brasileiro é elitista.
— O STF, ao mesmo tempo, julgou pessoas poderosas, que muita gente não
acreditava que seriam julgadas, e um negro chega à chefia da Casa. É um exemplo
notável, o início de um processo de dissolução da ideia tradicional de que o
Direito no Brasil é discriminatório — diz Campilongo.
No Planalto, a chegada de Barbosa à presidência do STF é vista como
“mais um recado” de que a inclusão social e racial se faz necessária.
— Essa posse será cercada de uma importância histórica e de um
simbolismo que ultrapassa a própria população negra no Brasil — disse a
ministra da Igualdade Racial, Luiza Bairros.
Amigo do ministro, o cantor e compositor Martinho da Vila afirma que
Barbosa se tornará referência para as crianças.
— É um momento importante porque os negros precisam dessa referência. As
crianças negras, discriminadas, marginalizadas, precisam dessa referência. Só
de estar no Supremo, o Joaquim já representava muito uma luta contra o racismo.
Agora, na presidência, essa referência é maior ainda.
Paulão Santos, presidente do Conselho Estadual dos Direitos do Negro do
Rio de Janeiro, cita a luta de Zumbi:
— Joaquim Barbosa representa o sonho de Zumbi dos Palmares. Um sonho de
igualdade plantado pelos nossos antepassados.
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